Rosso

Dear mum,

These flowers are for you
Wishing you here too
You light up the saddest days
Without whining or complaints
You accept life as it comes
You believe in fairies and miracles
So do I!
I know you’re in good hands
Being alive is a blessing
Breathing is a victory
We’ve travelled around the world
My head flying between the clouds
Your feet firmly on the ground
Or was it the other way around?
We have shared long conversations
So many sleepless nights
Filled with loud laughters and silent tears
You’ve shown me that dreams have no limits
And (almost) everything is possible
You believed in me when others didn’t
You gave me the hand and pushed me further
I’m sure 66 is not the end
Your path will continue
God is patient. He will wait
We still need you among us
You are out of my sight
But always present in my heart
Distance will never tear us apart.

Filipa Moreira da Cruz

Photos : Filipa Moreira da Cruz

Comment ça va?

Photo : Paul Laurent Bressin

Esta questão é-me colocada várias vezes ao longo do dia. Os franceses têm-na na ponta da língua e respondem por automatismo: ça va. E eu não fujo à regra porque ninguém está interessado em ouvir um desabafo, uma apreensão. Ninguém tem tempo para lamurias nem queixas. Ninguém se preocupa com os problemas dos outros nem as vidas alheias. Ninguém quer saber se estamos bem ou mal. Quem nos pergunta comment ça va está à espera de um simples ça va. Com os amigos a história é outra. Felizmente.

E se, de repente, começarmos a dizer… ça va pas?

Já passou um ano desde o primeiro confinamento. O que era impensável até 2020 tornou-se uma realidade. A nova normalidade engoliu os velhos hábitos. O cenário de um filme de ficção científica passou a fazer parte das nossas vidas. As imagens apocalípticas são o nosso quotidiano. O fim deste pesadelo teima em não chegar. Ça va pas!

No ano passado, em França, morreram 111 mulheres vítimas de violência doméstica. O número é mais baixo que o de 2019 (146), mas está longe do ideal 0. É verdade que ocorreram menos mortes, mas a violência doméstica aumentou consideravelmente desde a pandemia. O confinamento só veio piorar a situação de todas aquelas que não vivem num lar, mas sim numa prisão. Ça va pas!

A vacinação avança a passo de caracol. Os ricos contornam o sistema e conseguem doses pagas a preço de ouro. Lotes inteiros de vacinas desaparecem misteriosamente e outros são roubados, à descarada. Por outro lado, há tendas militares vazias, à espera de pessoas que teimam em não vacinar-se. Médicos e enfermeiros deitam frascos fora porque os utentes que estavam inscritos resolveram não aparecer. Ça va pas!

O desemprego na Europa atinge níveis assustadores e para muitos o layoff continua, pelo menos, até ao Verão. As próximas gerações vão herdar uma pesada dívida. Será o seu ADN económico-social. E isto num continente com uma reduzida taxa de natalidade. De acordo com dados apresentados pela Comissão Europeia, em 2018 houve 1,55 nascimentos por mulher. Apesar de tudo, a França continua a ser a campeã dos nascimentos do velho continente, mas os números também têm vindo a baixar. Ça va pas!

Os estudantes universitários são os mais sacrificados desde o início da pandemia. Não têm aulas presenciais há um ano, não têm recursos para comer nem aquecer os minúsculos estúdios que lhes servem de teto. Muitos viram-se obrigados a regressar à casa dos familiares. Outros têm vergonha e preferem sobreviver, mais mal que bem. Há ainda os que desistem da vida, de um dia para o outro. Fecham os olhos para sempre porque se recusam a ver este miserável mundo novo. Em Espanha, 40% dos jovens com menos de 25 anos estão no desemprego. Ça va pas!

Passaram quase 5 anos desde a assinatura do Acordo de Paris e estamos longe de conseguir reduzir os excessos que nos conduzem a uma catástrofe ecológica. O meio ambiente ainda não é uma prioridade para nenhum país. E de nada adianta apontar o dedo ao vizinho quando não limpamos a própria casa. A humanidade esteve em êxtase perante as fotografias das ruas vazias, dos animais que passeavam descontraidamente, dos oceanos que recuperavam a sua cor natural. Foi sol de pouca dura! Agora chocam-nos as máscaras lançadas na sarjeta e a quantidade de embalagens de comida e copinhos de cartão para o café atirados para o chão. Efeitos colaterais do take away. Ça va pas!

Da próxima vez que me perguntarem comment ça va, o melhor será ficar calada para evitar chocar os mais sensíveis ou dar um abanão aos mais distraídos.

Se não for Covid, pode esperar?!

Photo : KaDDD

Há uns dias ligou-me uma amiga. Finalmente (pensei)! A última vez que falamos ao telefone foi no início do ano. Depois dessa data enviei-lhe várias mensagens, mas nunca obtive nenhuma resposta. Quando atendi o telefone apressou-se a desculpar-se dizendo-me que estava muito ocupada. Com o quê? Não tem filhos e está em layoff desde novembro. Obviamente que estas ilações não foram pronunciadas em voz alta. Tento sempre evitar juízos de valor antes de conhecer a situação. Ainda bem que o fiz.

A Louise soube, em Fevereiro, que tem um cancro do cólon e começou, pouco depois, os tratamentos. Três vezes por semana, a ambulância vai buscá-la a casa para as sessões de radioterapia. O cateter já foi colocado para a quimioterapia que se segue. O médico disse-lhe que foi diagnosticada a tempo, mas lamentou que a paciente não tivesse ido à consulta desde o aparecimento dos primeiros sintomas. A minha amiga relembrou-lhe que o rendez-vous foi adiado três vezes por causa da « crise sanitária ».

Não pude deixar de pensar na minha mãe. Tal como a Louise, também ela não gosta de incomodar os outros com aspetos ligados à saúde e raramente se queixa. Quando me ligou para anunciar-me que tinha um cancro (o primeiro) disse-me: « estou com um probleminha ». Eu perdi o chão, faltou-me o ar. Fiquei sem palavras. Algo que acontece raramente. Na altura, vivia em Paris e estava a ponto de mudar-me, com a família, para a Nova Caledónia. O meu marido acabou por recusar a oferta de trabalho. Estava fora de questão ir viver para o outro lado do mundo.

A situação repetiu-se, mas eu não fui atrás da história da Carochinha. Quando a minha mãe me voltou a anunciar outro probleminha apanhei o avião e conversamos na sala da casa em Alvalade, pouco tempo depois de ter aterrado. Uma das vantagens de ter um aeroporto dentro da cidade. Acompanhei-a ao médico na Avenida de Roma e a uma consulta no IPO, onde fiquei na sala de espera. Desta vez, a minha mãe foi tratada exclusivamente no hospital público, o que a fez respirar de alívio por razões económicas e, sobretudo, humanas. Os serviços privados, muitas vezes, dão-se ares de hotéis de cinco estrelas esquecendo-se que os pacientes não precisam de room service 24 horas ou de um concierge, mas sim de quem cuide deles.

A Louise não tem outro remédio que ser seguida numa clínica privada porque a prioridade dos hospitais públicos ainda é a Covid. Felizmente, ela tem um bom seguro de saúde. Mas e se não fosse o caso? Como se tratam, neste momento, as pessoas que não têm dinheiro? Quantas operações foram adiadas? Quantas cáries não foram tratadas? (Espero que não seja o meu caso porque tenho pânico do dentista!) Quantos cancros não serão diagnosticados a tempo? Deixámos de ter direito a estar doentes. Só somos considerados seres humanos que necessitam assistência médica enquanto tivermos o vírus. Assim que o resultado for negativo deixamos de ser importantes aos olhos da medicina, ignorando-se os sintomas que persistem. Escrevo-o com conhecimento de causa.

Filipa Moreira da Cruz

Made in USA

Photo : Filipa Moreira da Cruz

A primeira vez que fui aos Estados Unidos tinha 14 anos. A minha mãe fez-me a surpresa e levou-me a Nova Iorque, uma metrópole fascinante com quase tantos habitantes que Portugal. Fiquei deslumbrada com a cidade que nunca dorme. Londres já me tinha conquistado, mas Nova Iorque superou todas as minhas expectativa porque consegue ser ainda mais eclética, cosmopolita, efervescente. Regressei várias vezes e já prometi à minha filha uma viagem a duas.

Seguiram-se seis outras estadias que variaram entre três semanas e dois meses. Tive a sorte de ter uma irmã que viveu vários anos por terras do tio Sam. Também aproveitei para ficar em casa de uma família americana o que me permitiu confirmar todos os clichés (ou talvez não). Abraços calorosos em vez de dois beijos, barbecue ao fim-de-semana, jogo de futebol americano com as cheerleaders a animar a equipa da casa, missa ao domingo de manhã, oração antes de cada refeição, coca-cola à descrição, jantar improvisado com sandes de doce de morango e manteiga de amendoim, os magníficos fogos de artifício no dia 4 de Julho, as gigantescas waffles com maple syrup

Este país da América do Norte é capaz de reinventar-se e a realidade supera, quase sempre, a melhor produção made in Hollywood. For better or worse. Ainda me lembro da cara de assombro dos jovens estudantes americanos quando viram Portugal no mapa na altura em que assisti a uma aula de História numa escola secundária perto de Pittsburgh. Coincidência ou não, o professor dedicou uma hora aos descobrimentos portugueses e espanhóis. Os alunos pediram-me para indicar-lhes no planisfério o país luso de onde saíram os navegadores que deram a volta ao mundo. Tal como acontece frequentemente, pensavam que o nosso país era uma região da vizinha Espanha. Mas quantos europeus sabem exatamente onde se situa a Moldávia ou a Letónia? E o que sabem acerca da Noruega ou da Ucrânia?

Photo : KaDDD

Os Estados Unidos não deixam quase ninguém indiferente. Há quem deteste e quem adore. Pertenço à segunda categoria, embora nunca tenha caído na tentação de comprar um bilhete de apenas ida. Talvez por falta de coragem, admito. Gosto de viver na Europa. No entanto, este país com mais de 328 milhões de habitantes deslumbra-me, apesar de só conhecer oito dos seus cinquenta estados, uma minúscula amostra desta enorme nação.

Este amor não é cego. Fico, como muitos, chocada com as evidentes incoerências do país. Apesar de 21 estados terem abolido a pena de morte, Michigan foi o primeiro em 1847, mais de metade do país continua a executar presos que se encontram no corredor da morte. Quase todos os indivíduos têm armas e não são raros os acidentes que envolvem jovens ou crianças. O aborto é outra questão sensível e está longe de conseguir uma unamidade.

Os 244 anos de história são ainda insuficientes para a maturidade sócio-política da nação. São vários os episódios que mancharam a tão sobrevalorizada reputação americana e dois dos lobbies mais poderosos, o das armas e o farmacêutico transformam qualquer presidente num fantoche. O dinheiro fala mais alto. É quase impossível mudar a ordem natural das coisas. Num território onde quem não tem um bom seguro de saúde pode morrer, Obama tentou mudar a lei, em vão.

O número de pessoas mortas por Covid-19 já ultrapassou as 500.000. Mais de meio milhão de seres humanos que perderam a vida desde o início da pandemia. Felizmente, o país livrou-se da tirania e da loucura de Trump e esperemos que o novo presidente tome bem conta dos seus. God bless America.

Filipa Moreira da Cruz

Nervos à flor da pele

Photo : KaDDD

Pandemia, paramédicos, paranóia,
Febre, tosse, exaustão.
Falta o ar, faltam testes, falta tudo.
Dúvidas… muita imaginação.

Clausura, solidariedade, (des)união.
Rebanho sem pastor,
Nenhum país tem a solução.

E quando ninguém se entende
O divino sobrepõe-se à razão.

Ricos, pobres, louros, morenos
Gordos, magros, solteiros, casados.
Do Sul, do Norte, de todo o lado!

Crianças, jovens e velhos.
Contam-se os vivos,
Enterram-se os mortos.
E cada qual é deixado à sua sorte.

Somos todos humanos.
Somos todos iguais?!
Sobreviver é uma vitória.
Pandemia, fim da história.

Filipa Moreira da Cruz

Voltar a aprender

Photo : KaDDD

O mundo está doente, a sociedade cheira a podre e os que por aqui andamos estamos meio (ou totalmente) perdidos. Chocam-me os atentados terroristas, os atos homofóbicos, xenófobos e racistas, o vandalismo e a destruição do património. A estupidez humana não tem limites.

Mas acima de tudo, choca-me o que se faz contra o ser mais vulnerável: a criança. E refiro-me ao apedrejamento do maior hospital pediátrico da Europa que cura crianças de todo o mundo, aos que obrigam as crianças a trabalhar em vez de as enviarem à escola, aos abusos sexuais praticados, muitas vezes, no seio da própria família, aos pais que abandonam os filhos no bosque, no centro comercial ou no parque de estacionamento para que eles aprendam…. Não seremos nós, pais e educadores, os que devemos aprender a exigir menos e a dar mais? Este vírus deixou-nos órfãos de afeto e os mais pequenos nem sempre entendem a razão pela qual beijos e abraços passaram a ser proibidos.

Sou totalmente contra os quadros de honra e as avaliações meramente quantitativas, independentemente da escala utilizada. Deveríamos valorizar mais a inteligência emocional, a criatividade e a sensibilidade de cada criança, privilegiando o être e não o savoir-faire. Mas ainda não estamos preparados. Que lástima! Para que isso acontecesse, teríamos de morrer e voltar a nascer livres de tabus e preconceitos ou então começar pelo fim, como diz Woody Allen.

Estou cada vez mais desiludida com este ensino excessivamente institucionalizado e formatado onde não há espaço para a diferença. Se as escolas são desenhadas por arquitetos e engenheiros então os programas deveriam ser pensados por pedagogos, educadores e professores que amam a sua profissão, mas infelizmente não é assim. A realidade é outra em Portugal, Espanha, França, Alemanha, Itália…

Felizmente, há exceções que alimentam a esperança. Conheci uma pequena escola na Irlanda onde na cantina se come quase tudo o que crianças e adultos cultivam no jardim e onde os alunos decidem cada dia o que estudar. Por incrível que pareça, a taxa de insucesso escolar é quase inexistente. O sistema « Amara Berri », criado no País Basco e a Escola da Ponte são outros bons exemplos. Há modelos que remam contra a maré. Bem hajam!

Mas (quase) tudo mudou de um dia para o outro, literalmente. De repente, crianças de todo o mundo foram obrigadas a ficar em casa, acentuando ainda mais as diferenças entre os que têm muito, os que têm pouco e os que não têm nada. As aprendizagens ficam em suspenso porque os pais não ensinam. E não lhe podemos exigir que o façam, pois não? Ao mesmo tempo, os professores esforçam-se por transmitir os conhecimentos à distância, mas nem as novas tecnologias salvam esta missão quase impossível.

Sem alunos de que vale ensinar? Sem plateia para quem toca a orquestra? Sem palco para quem declamam os atores? Uma vez mais, os adultos vitimizam-se face à sua nova condição de vida, esquecendo-se dos mais prejudicados: as crianças. Perdemos tanto tempo e energia com o supérfluo e esquecemo-nos do essencial. Como diz a minha filha, “é tão fácil ser feliz!”.

Filipa Moreira da Cruz
2020

Lockdown

Photo : KaDDD

How do you feel today?
I feel tired, anxious, weird, afraid and lonely
Fair enough…You’re experiencing a new situation

But be reasonable
Concentrate on good things

You’re alive and healthy
You have a roof above your head
You may dance in the kitchen if you want to
You have food
You have water to drink and also to take a shower
You have lot’s of toilet paper!
You have internet connection, a smartphone, a PC and a television
You have books, maybe some of them you don’t even knew they were there
You have friends and family
You have time

So, how do you feel today?
Grateful!

Filipa Moreira da Cruz